Luciano Carlos Cunha[1]
A objeção de que o veganismo causaria uma ruína à economia
A indústria de exploração animal é um grande negócio. Movimenta muito dinheiro em todo o mundo. Com base nisso, por vezes é defendido que, se muita gente se tornar vegana, haveria um colapso da economia e que, por essa razão, não devemos ser veganos.
O primeiro problema com esse argumento é que, mesmo que o veganismo em larga escala causasse uma ruína na economia, ainda assim isso resultaria em um mundo com menos sofrimento do que haveria em um mundo onde continuasse a exploração animal.
O segundo problema é que é falso que o veganismo em larga escala causaria uma ruína à economia. À medida que diminuísse a demanda por produtos de origem animal, aumentaria a demanda por produtos veganos.
A objeção de que os que trabalham na exploração animal perderiam seus empregos
Por vezes é alegado que o veganismo em larga escala faria com que as pessoas que trabalham na exploração animal perdessem seus empregos e que, por essa razão, não devemos ser veganos.
Há dois problemas fundamentais com esse argumento. Um problema diz respeito à concepção de ética assumida pelo argumento. O outro diz respeito ao que ele assume quanto aos fatos. Vejamos cada um deles separadamente:
O primeiro problema é que, mesmo que aquilo que o argumento alega ocorresse, perder um emprego, ainda que seja algo bastante ruim, nem de longe é comparável ao que os animais explorados sofrem. Por exemplo, se humanos fossem criados para serem mortos e consumidos, para fazer roupas, ou para serem usados como modelos de testes, ninguém diria que não devemos acabar com tais práticas só porque isso faria os trabalhadores de tal sistema perderem seus empregos.
Assim, o problema ético com o argumento é que ele assume uma concepção tendenciosa que dá maior peso ao prejuízo menor, só porque o prejuízo maior recairia sobre os animais não humanos. É portanto, uma concepção especista. Tal concepção jamais seria aceita se não soubéssemos quem seriam os beneficiados e quem seriam os prejudicados. Por exemplo, imagine que você tivesse que dizer qual dessas duas coisas é mais importante evitar: (1) evitar perder o emprego, ou (2) evitar passar por tormentos extremos durante uma vida inteira e ser morto de maneira brutal. Ninguém em sã consciência diria que é mais importante evitar perder o emprego. Isso mostra que a concepção de ética assumida pelo argumento não passa no teste da imparcialidade. É, portanto, uma concepção tendenciosa e, por isso, injusta.
O segundo problema diz respeito ao que o argumento assume quanto aos fatos. O argumento assume que, quanto mais pessoas se tornassem veganas, menor seria a oferta de empregos. Entretanto, isso é se esquecer que, à medida que aumentar a demanda por produtos veganos, aumentaria também as ofertas de emprego por conta disso, seja em empresas focadas exclusivamente em produtos veganos, seja em empresas que comercializam produtos decorrentes da exploração animal, mas que também trabalham com produtos veganos. Portanto, não há nenhuma conexão necessária entre um aumento no número de veganos e uma diminuição geral nas ofertas de empregos.
NOTAS
[1] Doutor em Ética e Filosofia Política pela Universidade Federal de Santa Catarina, coordenador geral no Brasil das atividades da organização Ética Animal (www.animal-ethics.org/pt). É autor dos livros Uma breve introdução à ética animal: desde as questões clássicas até o que vem sendo discutido atualmente (2021) e Razões para ajudar: o sofrimento dos animais selvagens e suas implicações éticas(2022). Publicou também capítulos em outras obras e artigos em periódicos especializados, que podem ser lidos aqui: https://ufsc.academia.edu/LucianoCunha. Contato: luciano.cunha@animal-ethics.org.
A produção deste texto foi financiada pela organização Ética Animal.
